#parasempretato

Eu confesso que sempre sei como começar um texto, mas esse paira em minha mente há seis meses e não flui. Tia Nonô sempre sabe como começar um texto, ou uma carta, sempre ajudou os amigos e pessoas queridas nisso, é expert em escrever até cartas de amor no lugar das pessoas, mas ainda assim, é difícil, passarinho. Esse ano tinha presságio de ser um bom ano, normalmente em anos com final ímpar acontecem coisas legais. Mas acho que essa “regra” se perdeu em 2017. Acho que a vida adulta não respeita regras adolescentes. Em fevereiro, numa segunda, daquelas em que a tia Nonô trabalhava bastante de manhã e estava tranquila a tarde, tu estiveste em meu pensamento, e eu rezei de forma muito forte que nada de mal te acontecesse. Fui dar uma carona para uma amiga que havia sido demitida, e a mãe me ligou contando que tu estavas com câncer. Naquela mesma tarde me comprometi a voltar pro centro espírita de forma mais assídua, afinal, desde que me mudei pra Passo Fundo não retomei os estudos espíritas, que tanto me ajudaram em momentos de dificuldade. Logo as coisas foram acontecendo, de uma maneira muito rápida e intensa, como tudo na vida da tia Nonô. Março foi um mês difícil no trabalho, que envolveu viagens, exaustivas feiras, uma entrevista importantíssima para evoluir na empresa, um amor que não vingou, troca de chefe. Tu seguias guerreiro e sempre que eu podia ia te visitar, bolava as viagens para passar por Porto Alegre, calculava os vôos para retornarem de forma a passar te ver. Uma gripe teve que me fazer ir embora sem te ver, já que tua baixa imunidade exigia muitos cuidados. Tia Nonô ama crianças, muito, demais, mas não tem muito jeito as vezes. Mas contigo tudo era fácil, qualquer coisa te entretinha, o barulho das pulseiras, até passar maquiagem te gerava curiosidade. Tu era um menino que interagia com a gente. Carinhoso, sem manha, uma delícia de conviver. Tia Nonô fez duas promessas a Deus, facílimas de cumprir até, para tua melhora: parar de beber refrigerantes, e parar de fumar. Tia Nonô sempre foi sem vergonha com o cigarro, pois era uma fumante eventual, fumava muito de vez em quando, quando estava com amigas ou muito triste. Talvez cigarro tenha sido mais difícil que refrigerante, mas cumpri as duas. Conforme abril chegou, tia Nonô se apaixonou por um cara que prometia ser muito legal, um colega de trabalho que tinha as mesmas preocupações, as mesmas dúvidas, e naquele momento tia Nonô se sentiu mais forte. Mas esse cara terminou com a tia Nonô pouco mais de um mês depois, logo antes da tua cirurgia, o que tornou tia Nonô uma chorona novamente. Tia Nonô até desmaiou, fez teste de gravidez, mas era tudo alarme falso. Ou talvez fosse o mano Vicente pairando em nossa família e decidindo onde deveria chegar. Ele e Deus já sabiam que tua mamãe precisava mais de amor que a tia Nonô nesse momento. Passarinho, o dia da tua cirurgia é tão vivo em nossa memória: tua carinha de assustado, tua gargalhada para o vô Renato através do vidro, as horas de espera, a chuva fina, a liberação para nossa subida ao andar da UTI, os minutos arrastados sentadas no chão acarinhando a Tai, a sensação de que Deus tinha se esquecido dali, a promessa ao Santo Antônio na capelinha (que eu trocaria o amor da minha vida pela tua cura, e seria feliz assim), a cara da médica intensivista e do cirurgião na porta nos comunicando tua partida. A dor no peito aperta tanto que parece que o ar não vai mais entrar. Liguei pro Zezo, pro Nico, pro cara que não atendeu. Eu queria que alguém me dissesse que era um pesadelo muito vívido que iria passar logo. Mas não passou. A UTI de mãos dadas com o vô Renato, a dor lancinante. O necrotério, o velório, as pessoas queridas que chegavam chorando e guardavam suas dores no bolso para sustentar as nossas. O abraço que eu e tia Bibi nos demos enquanto a família se despedida de ti sozinha quando o caixãozinho chegou. Era tudo tão surreal, passarinho. Quando voltamos pro hotel, a mãe me fez comer. Pedi um coca, em tom de desafio pra Deus, como se dissesse “tu não cumpriu tua parte, não vou cumprir a minha”. Foi o gole mais difícil da minha vida. Chorei tanto que não consegui beber. E assim veio junho, tia Nonô se afundou mais no trabalho, cancelou a festa de 30 anos, veio a notícia do mano Vicente, nosso Vico. Uma sementinha de esperança pra nos acalentar. Todo mundo tentando seguir em frente. Quando faziam dois meses da tua partida, tia Nonô perdeu um amigo de 23 anos num acidente de carro, numa semana de muito trabalho. Parecia que Deus estava precisando muito de anjos, porque não estava fácil. Agosto passou com duas crises fortes de choro, alguns amigos a menos, muitas tristezas a mais. Setembro viajando sem-fim a trabalho. Outubro, o cursilho para tentar resgatar minha fé e a promessa de que eu levaria Deus nos lugares onde não o sentisse, mas também a demissão. Novembro chegou com uma virada drástica, mudança de cidade, brigas com pessoas que amamos, tentativas frustradas, acordar cedo e contar os minutos do dia passando sem notícias. Então chega dezembro e o ano está terminando. Dia 04 tu faria 02 aninhos e teríamos uma grande festa. Talvez no céu tenha tido uma grande festa para ti, tenho certeza que sim. Eu só consigo te imaginar sorrindo, passarinho. Tua gargalhada era tão maravilhosa que só guardo ela em meu pensamento, nada de tristeza. Sei que tua vida em nossa família foi para tornar todos nós pessoas melhores. Tu era puro amor. Tu é só amor. E é esse amor que fez nascer o livro da Tai, é esse amor que fez o mano Vico vir pra nossa família, é esse amor que nos faz seguir tentando ser felizes. A tia Nonô quis muito ouvir essas palavras de ti, mas ouvir outras crianças me chamando “Nonôôôô” vai me fazer sentir que tu, de certa forma, existe em mim. E tu existe, nessa linda tatuagem que eu mostro com muito orgulho. Obrigada pelo privilégio de ter te amado, passarinho. 


Nada escapava das brincadeiras: tu adorou ser colocado na sacola depois que eu esvaziei ela, rimos muito essa noite.

A melhor risada do mundo!

O livro mais esperado do ano: nosso amor eternizado!

Espero que vocês também possam sentir tanto amor assim na vida, meus queridos leitores. E quem quiser o livro, entre em contato conosco! Ele será sorteado a quem segue o blog no dia 25/12.

Comentários

  1. É tão difícil escrever e expressar a dor da perda, mas é tão lindo continuar tentando viver com as lembranças da alegria de quem amamos.
    ❤️Lindo texto

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  2. É tão difícil escrever e expressar a dor da perda, mas é tão lindo continuar tentando viver com as lembranças da alegria de quem amamos.
    ❤️Lindo texto

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  3. Lindo simplesmente lindo...
    Acompanho a história do tatinho pelo a página do face desde o começo, tenho uma admiração enorme por essa família linda , mesmo não os conhecendo acho eles pessoa extraordinárias, fico feliz que no mundo ainda a pessoas como o Marcelo e a taiane , assim como o restante dessa família linda e abençoada! !!!!!❤❤❤❤anjo amado mesmo pelos os que não os conhecerao !!!!!

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  4. É difícil até de escrever. Deus inventou o amor,e nós vivemos ele , buscamos ele, somos felizes com ele e sofremos por ele. É nossa condição humana. Se as lágrimas curassem essa dor que até eu sinto sem saber ,eu choraria o que fosse preciso. Mas no fim, amor.

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